Paraense vence o câncer e conta que o segredo é não se entregar Hoje mé

Hoje médica e com 31 anos, ela descobriu o câncer no estômago quando fazia residência em São Paulo
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Filha de uma família humilde – o pai é taxista e, a mãe, autônoma – a paraense Renata de Barros Braga, de 31 anos, enfrentou, ainda na juventude, um desafio muito maior do que o de conseguir a tão sonhada – e disputada – vaga no curso de Medicina da Universidade do Estado do Pará (Uepa): o de superar um câncer grave e raro, descoberto aos 26 anos de idade.
Em 2009, ela havia acabado de ser formar médica e se mudado para São Paulo, onde ia fazer residência em Pediatria, um outro sonho antigo prestes a se realizar. Porém, antes mesmo de sair de Belém, a jovem já vinha sofrendo com alguns sintomas que a incomodavam muito, como fortes dores abdominais, de cabeça e refluxos, que ela creditava à chamada síndrome do intestino irritado, diagnosticada alguns anos antes.
Já em São Paulo, no entanto, os sintomas só pioravam. Sonhos estranhos que surgiram de repente fizeram com que a jovem ficasse mais preocupada com a situação. “Tenho uma forte ligação com a fé e o mundo espiritual. Nesses sonhos, era como se um espírito de luz me avisasse que eu ia ficar doente e que precisava perdoar pessoas e coisas do passado, caso contrário, não ia conseguir me curar”, conta.
Intrigada com a experiência, Renata decidiu compartilhar o ocorrido com uma amiga, que era também a sua chefe na residência. Foi ela quem a orientou a fazer alguns exames mais específicos para investigar os sintomas. O primeiro deles, uma endoscopia, apontou a presença de um tumor no estômago, que, mais tarde, com a realização de uma biópsia, foi confirmado como uma lesão maligna, ou seja, um câncer.
Sozinha em São Paulo, sem plano de saúde e sem dinheiro – o que ela tinha havia sido gasto para viabilizar a mudança de Estado –, Renata precisou contar com a ajuda e solidariedade de amigos – muitos dos quais também médicos – para enfrentar o problema.  A mãe, que tinha um pequeno negócio em Belém, largou tudo para acompanhar a filha. “Nesse período em que ela esteve longe, cuidando de mim, a loja até faliu, pois, como sabemos, o gado só engorda com o olho do dono”, diverte-se, hoje, ao lembrar o episódio.
Como o câncer de Renata foi considerado muito grave pelos médicos que a atenderam – a lesão tinha mais de quatro centímetros –, tomou-se a decisão de fazer um tratamento mais radical, com a retirada quase total do estômago e, só depois, os outros procedimentos, como a quimioterapia e a radioterapia. O tratamento, após a cirurgia, ainda durou entre cinco e seis meses. “Tive muita sorte, pois consegui fazer tudo por meio do SUS (Sistema Único de Saúde). Não foi fácil, principalmente essa fase depois da operação. As pessoas normalmente pensam que após a cirurgia nos livramos do problema, mas não é bem assim. Foi aí que eu tive que começar a aprender sobre as limitações que eu passaria a ter, sem falar nas reações advindas da quimioterapia e da radioterapia, que, no meu caso, só vieram depois do procedimento cirúrgico”, explica.
Concluído o tratamento físico, Renata ainda teve que lidar com o estresse emocional, agravado pelas dificuldades financeiras. “Embora o tratamento tenha sido feito pelo SUS, todo o resto era muito caro, os remédios, a alimentação, que precisava ser bastante específica no meu caso. Minha família ajudou como pode, inclusive fazendo ‘vaquinhas’”, lembra.
Mesmo com as dificuldades, ela seguiu em frente com os estudos. Fez mais duas residências e, hoje, é especialista em cardiologia pediátrica e ecocardiografia infantil. “Por conta da minha realidade, tive que começar a aprender a cuidar melhor de mim, a comer melhor, a ter hábitos saudáveis, a trabalhar menos. Ainda estou lidando com os efeitos de todo esse processo, mas já vejo minhas unhas mais fortes, meus cabelos começando a parar de cair e tenho mais força e vigor”, ressalta ela, que, hoje, vive com apenas uma parte do estômago, o equivalente ao órgão de uma criança de oito anos de idade.
Renata ainda aguarda o que ela chama de “carta de alforria”, que é, na verdade, o diagnóstico final de cura da doença, que, nesse caso, poderia ter sido dado três anos após o tratamento ter sido encerrado. No entanto, ela preferiu que se cumprisse o prazo de cinco anos, o que deve ocorrer até o final deste ano.
Após essa experiência Renata guardou para a sua vida vários aprendizados, que faz questão de compartilhar com as pessoas: “Não podemos nos entregar. Nunca. A força que temos em nós mesmos é o segredo da cura. Nunca tema. Nem desista. Quando digo ‘se entregar’ falo também do se entregar ao clima de doença, vestir-se como um doente. Preencha a cabeça com coisas boas. Creio que a nossa mente dita nosso futuro”.

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